As Aventuras de Huckleberry Finn
Samuel Langhorne Clemens (1835-1910), escritor americano que usou o pseudónimo literário Mark Twain, publicou em 1884 um romance intitulado The Adventures of Huckleberry Finn, que depressa se tornou imensamente popular e se encontra traduzido em várias línguas.
O romance conta a história do pequeno Huck Finn, um miúdo travessso e avesso à escola e a toda a forma de disciplina, filho de um alcoólico inveterado, confiado a duas respeitáveis senhoras e protegido por um juiz, para que o pai não possa pôr as mãos num tesouro que o miúdo e o seu amigo Tom Sawyer haviam encontrado. No entanto, o pai acaba por encontrar o garoto e ambos vivem juntos durante algum tempo, até que Huck foge com Jim, um escravo que pretende atingir o Norte dos Estados Unidos da América, onde a escravatura não existe, e assim encontrar a liberdade. Os dois companheiros separam-se e reencontram-se, no meio de peripécias várias, muitas delas perigosas, incluindo a associação com gente desonesta, diversas experiências violentas e a venda e posterior libertação de Jim, até que se sabe que uma das respeitáveis senhoras falecera, deixando uma fortuna a Huck e a liberdade a Jim. Ao saber que uma tia o quer adotar, porém, Huck foge da «civilização», de que se mostra farto, dirigindo-se para o Oeste ainda por desbravar.
Esta teia de sucessivas aventuras fez a celebridade da obra. Mas para a sua popularidade contribuíram igualmente outros fatores - o carácter parcialmente autobiográfico que Twain lhe deu, enxertando na obra as recordações da sua infância passada nas margens e nas águas do Mississípi, o paralelismo com factos historicamente verificáveis da História dos Estados Unidos, nomeadamente a escravatura e a luta pela sua abolição; o realismo das falas do escravo negro, que se exprime num peculiar dialeto das regiões do sul do país; a viva reprodução de formas infantis de falar, de pensar e de agir.
Por outro lado, Mark Twain insere o romance nas tradições mais fortes da literatura americana (associada a uma clara influência da literatura romântica europeia), na medida em que apresenta o pequeno Huck Finn como um herói que procura fugir da sociedade, numa tentativa de adquirir liberdade pessoal nas terras não desbravadas do Oeste mítico, onde a vida se pode construir voluntariosamente a partir do zero, longe das cidades, que corporizam uma ameaça à integridade e à identidade pessoais. O tema das Aventuras de Huckleberry Finn é, de facto, o conflito entre a felicidade do homem no seio da natureza e a sua corrupção em sociedade. A trama romanesca é, efetivamente, uma metáfora dramática pela qual o romancista pretende evidenciar esse conflito.
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